Glauco Mattoso comemora seus 60 anos com lançamento de dois novos livros

O poeta maldito completa 60 anos no dia de hoje. A comemoração será dividida com o tradutor Mamede Mustafa Jarouche, o professor Vicente Seraphim Pietroforte e o quadrinista Lourenço Mutarelli, no Espaço Cultural Barco

FOTO: Jailton Garcia

O ex-bancário José Ferreira da Silva se consagrou na década de 1970 como escritor marginal ou poeta maldito, sendo considerado o Bocage do século 20. O pseudônimo Glauco Mattoso foi adotado em alusão ao glaucoma, doença que lhe deixou cego nos anos 1990.

Sua estréia como escritor se deu de uma forma inusitada no período militar dos anos 1970. Na época, quando a censura dos ditadores fazia marcação serrada aos artistas, personalidades como Décio Pignatari e Caetano Veloso, recebem suspeitos envelopes e no interior páginas dobradas mais suspeitas ainda. O conteúdo era uma série de poemas e sátiras e também aforismo, que tratavam dos mais variados temas, de escatologia, homossexualidade a política e literatura. Assim foi a estréia do então funcionário do Banco do Brasil como escritor.

Para celebrar os 60 anos do poeta, contista, compositor, tradutor e ensaísta, Glauco Mattoso, os selos editoriais 'Demônio Negro' e 'Tordesilhas', juntamente com o 'Centro Cultural Barco', promovem na noite desta quarta-feira (29), um coquetel de lançamento dos livros: ‘Tripé do Tripúdio e Outros Contos Hediondos’ e ‘Bibliotheca Mattosiana’. O autor dará sessão de autógrafos e participa de um descontraído bate-papo ao lado do quadrinista, ficcionista e roteirista Lourenço Mutarelli e os professores Mamede Mustafa Jarouche e Antonio Vicente Seraphim Pietro Forte.

O Centro Cultural Barco fica na Rua Dr. Virgílio de Carvalho Pinto, 426, no Bairro de Pinheiros em São Paulo. Informações pelo telefone (11) 3081.6986. O evento começa às 19h30. ótima opção aos amantes da literatura. Depois do evento você pode dar uma esticadinha até o Bexiga, comer uma boa pizza e saborear um vinho português para esquentar corpo e mente na fria noite paulistana.

UM POUCO +
Glauco Mattoso, cujo nome real é Pedro José Ferreira da Silva, nasceu na capital paulista em 1951. Estudou Letras na Universidade de São Paulo, mas não chegou a completar o curso. Entre 1976 e 1994 colaborou em vários periódicos do Rio de Janeiro, como Pasquim e 34 Letras, e também de São Paulo, como Chiclete com Banana e Jornal da Tarde. Em 1977 organizou, com Nilto Maciel, Queda de Braço: Uma Antologia do Conto Marginal. Participante do grupo de poetas “marginais” que, nos anos de 1970, publicava em periódicos alternativos, Mattoso reuniu, em 1981, parte de sua produção poética no livro Jornal Dobrabil, 1977/1981. Ainda em 1981 escreveu, para a coleção Primeiros passos, da Brasiliense, O Que É Poesia Marginal. Nas décadas de 1980 e 1990 participou ativamente de palestras e debates sobre poesia e arte. Considerado uma das vozes mais fesceninas da poesia brasileira comtemporânea, o poeta, herdeiro de Gregório de Mattos e Bocage, é sempre lembrado pelo uso de linguagem obscena, satírica, por vezes chula. Sua trajetória poética abrange dos poemas concretos, visuais, da primeira fase, aos sonetos camonianos de Centopéia: Sonetos Nojentos & Quejandos (1991) e haicais de Haicais Paulistanos (1992).

APERITIVO

#6 LÚCIO TREVO DE QUATRO OLHOS [1977]
Lúcio Trevo é cego de um olho e míope do outro.
Mas nos sonhos Lúcio Trevo vê bem
com os dois olhos — e sem óculos.
Noite passada, então, Lúcio Trevo sonhou
que estava cego de um olho e míope do outro.

NOTA: Outra alusão do autor à própria cegueira prognosticada em pesadelos, este microconto satiriza a célebre fábula oriental do filósofo que não sabia se era um homem que sonhara ser borboleta ou se era uma borboleta que estava sonhando ser homem. Pertence à série "Fábulas rasas & contos fulminantes".

SONETO SINTÉTICO
De como a poesia é definida
depende da trajetória do poeta.
Qual é, pergunto, a fórmula secreta
que traça em poucas linhas uma vida?

Segundo Rilke, a lira não duvida.
mas Eliot é turrão, e tudo objeta.
Bashô quanto mais crê menos se aquieta.
Pessoa diz que é fé na dor fingida.

Divergem tantos mestres só no tom.
Não há por que dar tratos ao bestunto:
há química no verso, não um Dom.

Qualquer opinião, qualquer assunto
será, verdade ou não, poema bom
se for densa a fração, breve o conjunto.

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